sexta-feira, 29 de janeiro de 2016

Uma polémica pateta

O concelho de Caldas da Rainha devia ser conhecido pela sua fronteira de mar, pelos produtos da agricultura, pela tradição ceramista, pelo património termal, pelos bons restaurantes que tem, pela Escola Superior de Artes e Design, pelos embriões de movimentos inovatórios no domínio da criação cultural... e pela tradição erótico-satírica, que vai de Bordalo Pinheiro aos falos.
Mas não é. E não é porque a sua elite urbana vive fechada ao mundo, porque a Câmara Municipal é incompetente e as oposições são incapazes de propor alternativas robustas e credíveis, porque o que era e é património se perdeu, caiu no esquecimento ou se degradou.
A polémica em torno de um concurso criativo que tem por lema os pénis emblemáticos do concelho e que foi suscitada pela queixa de um cidadão, tão legítima como a liberdade de expressão que torna possível esta iniciativa, é um símbolo tristonho da incapacidade local, de onde nunca saiu uma imagem de marca para o concelho.
Caldas da Rainha tem muito mais do que a tradição fálica e nem vale a pena andar, mesmo que figurativamente, a pôr a coisa ao peito tipo "je suis sarda" ou aproximado, porque não é por aí que Caldas da Rainha conseguirá recuperar a boa imagem que em tempos já teve.
 

A notícia no "Correio da Manhã"...
... e o ímpeto censório do Facebook, que não permitu a reprodução do boneco

quarta-feira, 27 de janeiro de 2016

Cavaco Silva




© 2006-2016 Presidência da República Portuguesa
 
Fui crítico de Cavaco Silva quando ele foi primeiro-ministro e, reconhecendo a competência de alguns dos seus ministros, não gostei dos seus governos.
Nas três eleições presidenciais que Aníbal Cavaco Silva disputou, não votei nele em duas e, na terceira (2011), abstive-me por não ter um candidato que correspondesse ao que pensava e por considerar que a reeleição de Cavaco Silva estava garantida à primeira volta.
Cavaco Silva foi Presidente da República entre 2006 e este ano, 2016.
Exerceu o seu mandato em circunstâncias políticas difíceis e de forma muito digna. Cometeu erros mas, para mim, o balanço do seu mandato é positivo e digno. E, por isso e pela sua função institucional, respeito-o.
O Presidente da República, seja ele quem for, é, por definição, o representante máximo da nação e o comandante supremo das Forças Armadas.
Pode ser criticado (como é norma da democracia) mas o insulto que lhe for feito é um insulto a todos nós. Sobretudo quando, e acredito que sejam praticamente todos, os que o insultam não os teriam no sítio para o fazer de viva voz e cara a cara.
Marcelo Rebelo de Sousa, em quem votei (por convicção e porque receei que pudesse haver uma 2.ª volta), será o próximo Presidente da República.
Espero que o seu mandato seja positivo e digno para o País e para o próprio.


Já não é "reservado o direito de admissão" quando toca aos carcanhóis?





Não se pode dizer que fique bem a um candidato presidencial estender a mão à caridade pública política depois de ter saído derrotado de uma eleição em que, ele como outros, garantiam contra todas as evidências, que iam ganhar.
É o caso de Paulo de Morais, estruturalmente candidato a caudilho mais do que a Presidente da República, que vem fazer agora fazer o peditório do "dia seguinte".
Costuma-se dizer que quem vai para o mar avia-se em terra e entrar em eleições sem o devido fundo de maneio, e sem indicações razoáveis de que na pior das hipóteses se chega ao pote da subvenção pública é, no mínimo, uma aventura. E a política não é para aventureiros. Ou, para seguir a doutrina desta espécie de evangelizador, só os corruptos é que podem ser aventureiros... 
Esta situação de pouco decoro político não deixa de ser ainda pior perante a campanha monomaníaca do candidato: a corrupção.
Depois de ter andado a disparar a torto e a direito contra praticamente toda a gente, como é que vai separar os contributos "bons" (das suas apóstolas e apóstolos, provavelmente) dos contributos "maus" (os políticos que não ele e o resto do mundo)?
Já não há um "reservado o direito de admissão" no que toca aos carcanhóis?


*

Eis o tipo de apoios e de seguidores que a criatura inspira:

"Chegou o momento de mostrar a solidariedade para com o nosso guerreiro da corrupção que falou em nome de todos os portugueses activos no combate á corrupção que devastou este país para enriquecer uma mão cheia de gente desonesta que traiu a própria Pátria para ficarem ricos á custa do suor dos grandes produtores de valores que, por incrível que pareça continuam a ignorar serem assaltados, perdendo a vontade e a inteligência de lutar contra os grandes vigaristas que assaltaram o povo e a pátria, até ao cúmulo da desonra internacional e da banca rota. A HISTÓRIA ESCREVERÁ EM LETRAS DE OURO O NOME DE TODOS AQUELES QUE ESTANDO LUCIDOS E CONSCIENTES LUTAM PELA SUA HONRA E POR ESTE POVO AINDA TÃO IGNORANTE POLITICAMENTE."

 

O PS de Caldas da Rainha a dar-me razão


Três dias depois de eu aqui ter escrito que a Câmara Municipal de Caldas da Rainha "comprou" o património termal sem ver, e que só agora se descobriu o seu estado de degradação, o PS local veio dar-me razão, criticando (como eu) a gestão camarária:
 
 
A constatação do PS não deixa só mal a câmara e o seu presidente da "nova dinâmica" mas também quem, na Assembleia Municipal, apoiou a coisa.  Sem a verem, claro.
E, estranhamente, sem que a ninguém ocorresse verificar todos os pormenores do que estavam a "comprar".
Esta situação é mais um retrato exemplar da irresponsabilidade camarária, mais no meio de tantas trapalhadas, não abona igualmente a favor da responsabilidade das oposições, que nem terão compreendido bem a questão em cima da mesa.
Incluindo naturalmente o PS que, como tantas vezes acontece, tarde piou.
 
 

 
A votarem  a favor do que nem sequer quiseram conhecer, todos contentinhos da Silva
 

terça-feira, 26 de janeiro de 2016

12 apontamentos sobre as eleições presidenciais


Cavaco Silva – Teve dois mandatos dignos, deixa Belém a um Presidente diferente no estilo, na formação e na prática política. Marcelo Rebelo de Sousa é um bom sucessor de Cavaco, com a vantagem de ser jurista e especialista em direito constitucional.

BE – Os bons resultados do BE nas legislativas e agora nas presidenciais não são estruturais. A amálgama trotzkistas – maoístas não garante um “bloco” homogéneo para sempre.

“Espelho meu…” – Todos os nove candidatos perdedores foram dizendo que iriam à segunda volta ou que chegariam mesmo a vencer já ontem. Acreditariam mesmo nisso, precisariam de o dizer para se afirmarem pessoalmente e robustecerem psicologicamente, tiveram maus conselheiros ou havia motivos, insondáveis mas talvez legítimos, para insistirem na afirmação?

Henrique Neto – O resultado de 0,8 por cento é muito mau, remetendo-o para esse cadinho de derrotados de fim da linha. Não merecia mas a democracia é assim. 

Marcelo Rebelo de Sousa – Teve um triunfo pessoal e político. Quem não concordou com o golpe de Estado parlamentar do PS não pode deixar de se sentir vingado com a sua eleição. O seu discurso de vitória foi ambivalente, como se tivesse gostado do triunfo mas receasse os cinco anos de mandato que o esperam. Se lhe correr tudo bem, talvez não se recandidate a um segundo mandato.

Paulo de Morais – O caudilhismo demagógico só seduz os ingénuos (e as ingénuas). Se tivermos sorte, pode ser que o trambolhão político que sofreu o devolva às profundezas e o obrigue a pensar. E a mudar de corte de cabelo.

Paulo Portas – Vai ser o senhor que se segue daqui por cinco anos?

PCP – A versão comunista de Alberto João Jardim, tão trauliteiro como o original, conseguiu ficar à frente de Tino de Rãs. É obra. Jerónimo de Sousa ficou oficialmente satisfeito. Os militantes do PCP, portanto, também têm de ficar oficialmente satisfeitos. Só destoa a “boca” foleira da “candidata engraçadinha” mas fica visível que as foleirices da “esquerda” é que são boas. 

Pedro Passos Coelho – Interveio à sua maneira, felicitando o “Professor Rebelo de Sousa”, com a reserva que lhe é inerente. Esteve neste triunfo e não esteve. É de esperar que a sua breve declaração seja um tiro de aviso e um sinal de que vai regressar.

“Portugueses e portuguesas” – Talvez fosse bom inovar nesta fórmula tão pernóstica. Não há erro nenhum em dizer só “portugueses”. E quando um dia ficar consagrado o “terceiro sexo”, como é que os políticos vão dizer?

PS – Este partido (e não o esqueçamos: este PS de António Costa) foi um dos grandes derrotados das eleições presidenciais. Dividiu-se entre dois candidatos e o resultado (em percentagens) foi inferior ao das eleições legislativas. Se o mau resultado de Maria de Belém foi demasiado mau para fazer mossa na “nomenklatura” bramanista de Costa, o débil resultado de Sampaio da Nóvoa não serve de cimento para a camarilha de flibusteiros que agora domina o partido e o Governo.

Sondagens – Nas eleições legislativas, a tendência geral das sondagens foi a de uma vitória da coligação PSD/CDS. Nestas eleições presidenciais, a tendência geral das sondagens foi a de uma vitória de Marcelo Rebelo de Sousa à primeira volta. Os resultados, nos dois casos, confirmaram as respectivas tendências. “As sondagens valem o que valem”? Convinha começar a pensar em adaptar o discurso.


(Publicado no Tomate.)
 
 

domingo, 24 de janeiro de 2016

O "tempo novo" da filha-da-putice fiscal

O aumento dos preços dos combustíveis tem sempre dois grandes efeitos negativos para os consumidores: um é directo e faz-se sentir logo no bolso de quem se abastece para se deslocar no seu veículo e o outro é indirecto e faz-se sentir no preço de venda ao público dos produtos que chegam aos consumidores por intermédio do transporte rodoviário.
Pode argumentar-se, como faz este governo ao anunciar com algum despudor o aumento do imposto sobre os produtos petrolíferos, que este imposto (cujo aumento provoca de imediato um aumento do preço de venda dos combustíveis) é "indirecto".
Mas argumentar isto, sobretudo quando os consumidores andam muito atentos à bizarra situação de ter o preço geral do petróleo a cair e o preço dos combustíveis a diminuir muito vagarosamente é demagogia e da mais grosseira.
Aguentámos, em Portugal, aumentos sucessivos de impostos em 2010, com o PS, e a partir de 2011, com o PSD e o CDS (no cumprimento do "programa da troika", depois da situação de ruína nacional a que o PS nos conduziu), e sobrevivemos.
Mas esses aumentos foram generalizados. Talvez mesmo exageradamente generalizados. Foi revoltante, claro, mas havia uma lógica que não era de facção.
Agora, este anunciado aumento de um governo "de esquerda" do imposto sobre os produtos petrolíferos é ainda mais revoltante do que todos os outros aumentos.
 
 
O "tempo novo" do PS é isto: pôr todos a pagar os benefícios de algum
 
Primeiro, porque é universal e a ele ninguém escapa, desde o mais pobre dos trabalhadores que tem de meter combustível no carro em 3.ª ou 4.ª mão para poder ir trabalhar em regiões que não dispõem do luxo dos transportes públicos, ao grande empresário que troca de carro de topo de gama através da sua empresa de dois em dois anos.
Segundo, porque se destina a compensar o dinheiro que vai ser dado a sectores específicos, aos "clientes" políticos do actual governo: a prenda de 10 por cento do IVA a um sector comercial que fará perder por ano 350 milhões de euros de receita fiscal; os aumentos (seja pela reposição de cortes seja pelos privilégios das 35 horas e outros) da função pública; ou a devolução das empresas de transportes públicos aos sindicatos do PCP.
Este aumento do imposto dos combustíveis, a "devolução dos rendimentos", a "reversão" e os muitos chavões dos flibusteiros que fizeram o primeiro grande golpe de Estado parlamentar da democracia portuguesa resumem-se a isto: a uma filha-da-putice fiscal que, reveladoramente, tem o apoio do PCP e do BE e já não suscita os protestos de quantos clamavam contra o anterior governo, com razão, sem razão e porque tinham medo de protestar contra o patrão, o marido, a mulher ou a namorada.

sexta-feira, 22 de janeiro de 2016

Comprar sem ver

 
Indignaram-se os ilustres membros da "nomenklatura" política caldense (nem todos porque alguns se baldaram, como popularmente se diz) durante uma vista ao Hospital Termal e aos míticos "pavilhões do parque", que encontraram em acentuado estado de degradação. O "Jornal das Caldas" dá duas páginas à coisa, a "Gazeta" fica-se por uma.
 
 
 
Na primeira página do "Jornal das Caldas": compraram sem ver e agora queixam-se
 
 
A indignação desta gente é um pouco tonta. E a sua expressão também não revela nada de muito favorável aos visitantes.
A Câmara Municipal de Caldas da Rainha e os seus megalómanos gestores e a Assembleia Municipal assumiram, da forma mais leviana que em termos políticos se pode fazer, os encargos do património termal de Caldas da Rainha. Aparentemente desconheciam o que quiseram comprar. Com o dinheiro de todos, como é costume. 
Todas as regras da prudência, da boa gestão e do mais elementar bom senso recomendavam que, antes de darem esse passo, se inteirassem ao pormenor do estado do hospital e dos pavilhões. Não o fizeram. Bem podem limpar as mãos à parede. 
E não se queixem já porque haverá muitas mais lágrimas para derramar quando a câmara da grotesca "nova dinâmica" começar a apresentar-nos a conta para pagarmos.

Vitórias e derrotas nas eleições presidenciais

Se o resultado definitivo das eleições presidenciais deste domingo vai depender dos votos dos eleitores, nesta fase final de uma campanha em que há dez candidatos é possível fazer previamente um apuramento das vitórias e derrotas. Ou, mais exactamente, da vitória e das derrotas e em termos políticos.
Porque, mesmo sendo as candidaturas individuais, as mais destacadas estão estribadas em intervenções políticas e partidárias e as outras, ditas independentes, estão naturalmente estribadas em projectos políticos de natureza pessoal e, mesmo num caso, com uma ambiciosa perspectiva partidária muito clara.
Poder-se-á dizer que esta abordagem é irrealista porque os votos não estão deitados nem contados mas, à luz das sondagens conhecidas e das regras comuns de experiência política, alguém duvida de que já existe um vencedor antecipado e que o protagonismo dos outros nove não é mais, onde não há “bluff” e a vontade é sincera, um simples “wishful thinking”?
 
Tino de Rans, Cândido Ferreira e Gonçalo Sequeira
 
Comecemos pela maioria e pelas três candidaturas unipessoais que muito provavelmente receberão o menor número de votos: Tino de Rans, calceteiro e presidente de uma junta de freguesia, Cândido Ferreira, médico, e Gonçalo Sequeira, psicólogo e/ou comercial, salvo erro.
Pensarão realmente estes três que têm alguma possibilidade de obterem um número suficiente de votos e uma percentagem significativa na distribuição dos votos para conseguirem vencer a eleição presidencial? Será que, no seu íntimo, algum destes candidatos é capaz de garantir às imagens reflectidas nos seus espelhos que vai ser mesmo presidente?
Tino de Rans deve conseguir notoriedade suficiente para se candidatar à presidência da sua câmara municipal, Cândido Ferreira talvez queira deixar esta marca no seu percurso para memória dos seus descendentes e Gonçalo Sequeira talvez confie que a sua notoriedade lhe dê mais clientes.´
A sondagem que na semana passada saiu no “Expresso” dá a cada um deles 0,2 por cento dos votos. Se este número, ou aproximado, se confirmar, e apesar de todas as suas intenções, ganharão uma pesada derrota. Mas o tempo de antena que conseguiram obter deve compensá-los, psicologicamente.

 
Marisa Matias, Edgar Silva, Paulo de Morais e Henrique Neto

 
Há mais quatro derrotados óbvios e a derrota de dois deles estende-se aos dos próprios partidos de cujas entranhas, digam o que disseram quanto à sua categoria unipessoal, saíram.
Nas eleições legislativas de Outubro do ano passado, o BE e o PCP tiveram, respectivamente, 550 945 votos e 10,19 por cento e 445 901 votos e 8,25 por cento. Esta sondagem a que nos referimos dá a Marisa Matias (BE) uma percentagem de 4,8 por cento e a Edgar Silva (PCP) uma percentagem de 4 por cento.
Argumentar-se-á, como sempre, que “as sondagens valem o que valem” mas há três factos iniludíveis: (a) se os resultados dos candidatos do BE e do PCP nestas eleições forem inferiores aos das legislativas, terão sofrido uma primeira derrota em termos muito simplesmente factuais; (b) a derrota será sempre mais pesada quando se atende ao facto de a apresentação destes candidatos ter visado a fixação dos eleitores dos dois partidos; e (c) ambos puseram como desígnio supremo das suas candidaturas impedir a eleição do candidato “da direita”.
Numa lógica ainda partidária, mas numa perspectiva de formação de um partido a médio prazo com base numa eventual federação de movimentos independentes concorrentes às eleições autárquicas, encontra-se ainda Paulo de Morais. Com um discurso paupérrimo, este candidato apostou na demagogia e na criação de uma imagem de caudilho messiânico. Esta sondagem dá-lhe 1,6 por cento. Com o seu triunfalismo tão espampanante como o seu penteado, Paulo de Morais só poderia cantar vitória se conseguisse obter uma percentagem superior a 10 por cento. Dificilmente o conseguirá. E a sua derrota também representará a derrota, por ter tentado federá-los, capturando os seus eleitores, dos movimentos independentes.
Henrique Neto, o empresário do PS que o PS renegou, ficará também entre os últimos lugares. Apresentou-se com um projecto de base individual, com uma campanha estruturada mas os seus potenciais eleitores (à direita e à esquerda) poderão preferir os seus candidatos “naturais”. A sondagem do “Expresso” dá-lhe 1,1 por cento. O resultado não deve ser muito melhor.

 
Sampaio da Nóvoa, Maria de Belém e o PS

O PS é e será o grande derrotado destas eleições presidenciais e já o foi logo à partida.
Por um simples e básico motivo: o segundo maior partido do leque partidário português, o partido do actual governo (que conquistou por um golpe de Estado parlamentar) e o maior partido da “esquerda” não conseguiu ter um candidato único, nem tão pouco apresentar-se unido, contra o candidato único da “direita”.
Depois deste ponto de partida, tão trágico como caricato, a situação ainda se agravou. O PS “costista” cristalizou-se em torno de Sampaio da Nóvoa e a restante oposição interna apoiou Maria de Belém. E não se pouparam nas críticas.
O resultado não poderá deixar de ser obviamente mau: a sondagem que temos vindo a citar indica que Sampaio da Nóvoa terá 16,6 por cento dos votos e que Maria de Belém ficará com 16,3 por cento. Os resultados das legislativas de há três meses deram ao PS unido 1 174 730 votos e 32,33 por cento na repartição dos votos. Poderá haver quem diga, se os votos dos dois candidatos do PS ultrapassarem estes valores (o que só por hipótese se pode ter como provável), que o partido de Costa não sai derrotado das presidenciais. Mas sai. Basta, aliás, que nenhum dos seus candidatos não tenha conseguido chegar à Presidência da República.
Esta divisão, onde a “nomenklatura” costista disfarça mal o apoio e o incentivo do seu secretário-geral a Sampaio da Nóvoa, vai ter consequências internas.
A oposição (ou oposições) ao actual secretário-geral e primeiro-ministro não se tem dado a muitas ousadias desde o golpe de Estado parlamentar e, salvo se houver uma crise que ponha em causa o governo “das esquerdas”, vai esperar por uma melhor oportunidade para contar espingardas e voltá-las contra Costa. Se não forem dizimados na “guerra fria” que deverá seguir-se, hão de apresentar-se um dia a combate.
A divisão Sampaio da Nóvoa/Maria de Belém é, apenas, uma das munições que serão utilizadas num partido que demonstrou, no assalto ao poder, que já não respeita os valores da democracia.
Estas eleições presidenciais só são boas para o PS se o conseguirem trazer, mesmo que num processo conturbado, para o seio da democracia.
 Marcelo Rebelo de Sousa
 
 Marcelo Rebelo de Sousa conta nestas eleições presidenciais com uma vitória prévia que, com mais ou menos votos, ninguém lhe tira: uma candidatura claramente independente, movida e mantida pelo próprio que desde o seu início e até à véspera da votação surge sempre como ganhadora à primeira volta.
O que dá maior peso a essa vitória pessoal são três pormenores reveladores: por um lado, esteve no terreno quase sem contar com os aparelhos dos partidos que, em termos eleitorais, são a sua base “natural”; por outro lado, pôs todos os restantes candidatos partidarizados a criticarem-no praticamente todos os dias (as críticas generalizadas, algumas vezes demagógicas, devem ter contribuído mais para a sua notoriedade e para o vitimizarem do que para lhe retirarem votantes); e, finalmente, criou o deserto à sua volta – não apareceu mais nenhum candidato “da direita” ou “do centro-direita” (a imprensa nunca se entendeu nesta classificação taxinómica).
Todas as sondagens, todas elas, dão Marcelo Rebelo de Sousa como eleito logo à 1.ª volta ou, na pior das hipóteses, eleito à 2.ª volta.
Mesmo numa 2.ª volta, não se vê como o número dos eleitores dos restantes nove, e mais os “zombies” que poderão despertar nessa altura, pode sobrepor-se aos votantes iniciais de Marcelo e aos que compreendam qual o mal menor.
Vitorioso em toda esta fase inicial, Marcelo Rebelo de Sousa, a ganhar as eleições, e não apenas por ser esse o seu ambiente político, dará também uma vitória ao PSD, ao CDS e a todos os cidadãos que, tendo ou não votado nestes partidos em Outubro, receiam (e com razão) o abismo financeiro e económico para onde o actual governo do golpismo parlamentar nos empurra.
Precisamos todos (mesmo os que não querem votar em Marcelo Rebelo de Sousa) de um pouco de bom senso e de racionalismo político e constitucional na Presidência da República e não de mais flibusteiros.
Se Marcelo Rebelo de Sousa ganhar as eleições presidenciais, a sua vitória é também a nossa e a do País.
 
 
 
 

 

 

 

sábado, 16 de janeiro de 2016

35 horas

A polémica das 35 horas de trabalho semanal na função pública não dá dos trabalhadores da administração pública uma boa imagem.
Ninguém (nem as próprias organizações sindicais ou os partidos amigos) consegue explicar por que motivo é que defendem esse regime de trabalho e por que carga de água é que, num Estado que não tem dinheiro para tudo, o seu pessoal há de trabalhar menos horas e deixar o que fica por fazer (e será assim tanto?) para as "horas extraordinárias", mantendo o regime de excepção da ADSE e, na prática, uma garantia de postos de trabalho quase perpétuos.
Fora da administração pública, para os trabalhadores do sector privado, não há semanas de trabalho de 35 horas, não há um sistema de saúde automaticamente melhor do que o mítico serviço nacional de saúde, não há, em geral, as "horas extraordinárias".
E são estes mesmos trabalhadores que, quando precisam de tratar de algum assunto nos serviços do Estado, têm de "tirar o dia" para se adequarem aos horários limitados desses mesmos serviços, onde a tradição e as más memórias dizem que o atendimento é mau, a eficiência é duvidosa e é fácil ver os funcionários a conversarem (sobre assuntos de trabalho?) e a saírem (para o café ou para diligências externas) bem à vista de quem está à espera. 
 
 
"Em luta pelas 35 horas" mas não pelo serviço público

sexta-feira, 15 de janeiro de 2016

Presidenciais: a coisa das causas

25 de Abril e Liberdades, Ambiente e Alterações Climáticas, Assuntos Constitucionais, Cidadania Sénior, Cidades e Desenvolvimento Territorial,  Combate à Pobreza e Exclusão Social, Conhecimento, Cultura, Desporto, Diáspora, Economia e Inovação, Igualdade de Género e Combate às Discriminações, Juventude, Língua Portuguesa, Mar, Movimentos Sociais e Cidadania, Segurança e Defesa, Serviços Públicos, Trabalho, União Europeia.
O que significa este conjunto de palavras, algumas delas combinadas entre si? Tudo e mais alguma coisa. Etiquetas sociais e/ou políticas. Problemas por resolver ou resolvidos. Enumerações de temas de relevância… bem, generalizada ou só em parte?
Isto são “causas”. E estas “causas” (problemas resolvidos, por resolver ou assim-assim?) saem directamente do programa ou, melhor, para sermos rigorosos, do site da candidatura presidencial do antigo reitor universitário Sampaio da Nóvoa. 
Se o que lá estão a fazer, por si, não é compreensível, a única explicação para a enumeração das ditas “causas” é a possibilidade de associar a cada uma delas um homem e uma mulher que, sob a tutela de outro homem e de outra mulher, aparecem no dito site como “mandatários das causas”. Embora não haja explicação para o que significa, por exemplo, ser-se “mandatário da causa” do 25 de Abril e das Liberdades, dos Assuntos Constitucionais, da Diáspora, da Segurança e Defesa ou da União Europeia. 
No seu conjunto encontram-se entre estes pitorescos “mandatários” uma impressionante quantidade de “ex” e “líderes”, actrizes, dois realizadores de cinema, muitos professores, dois militares, diversos “especialistas”, um “maratonista”, um comendador, administradores da Fundação Gulbenkian, um subdirector e até um “sócio fundador de 10 empresas de desenvolvimento e inovação tecnológica”. Como dedicarão os valiosos conhecimentos geralmente aprendidos no Estado às “causas” é que não se sabe.
Nem terá de se saber porque, na prática, o que estes “mandatários das causas” fazem é compor (com episódico proveito para os próprios) uma outra versão do que seria a sua simples presença numa eventual comissão de apoio ao candidato. Ou seja, em termos práticos, aparecem para convencer os respectivos parceiros, amigos, sócios, familiares, a irem votar no candidato.
E salvo se esta coisa das “causas” revelar vida própria até ao dia 24 deste mês (e tudo parece possível nestas eleições presidenciais), não se pode dizer que a bandeira das “causas” corresponda a qualquer vontade sincera de… resolver problemas?
Além disso, a coisa tem duas falhas monumentais: uma delas é a ausência de um terceiro mandatário (LGBT) que evitasse a divisão sexista que se traduz num mandatário homem e num mandatário mulher e mais nada; e outra é a ausência de uma causa de apoio ao bom tratamento dos animais domésticos e de combate ao seu abandono e aos maus-tratos de que são vítimas.
E isso apenas porque a demagogia consegue quase sempre ser mais clamorosamente imperfeita do que a sinceridade.
 
(Publicado em13.01.16 no Tomate.)

terça-feira, 12 de janeiro de 2016

E quando é que começarão a dizer "Foda!" em vez de "Foda-se!"?!

 
Como a imprensa muito gosta de dizer, "é oficial": o "-se" perdeu, definitivamente, e por motivos que vão para lá da simples evolução da língua.
Não há "evaporou-se", "afundou-se", "reuniu-se", "fechou-se", por exemplo. O que há é isso tudo e sem o esclarecedor "-se", o que também, segundo os cânones, transforma tudo em acções efectuadas por terceiros: a água evaporou alguma coisa ou alguém, a Bolsa afundou alguma coisa ou alguém, o Comité Central reuniu alguma coisa ou alguém, a porta fechou alguma coisa ou alguém.
É uma espécie de epidemia maligna, tipo peste suína, que tende a alastrar, com a qual, conservador na língua e profissionalmente obrigado a respeitá-lo (mesmo no uso do acordo ortográfico quando o cliente legitimamente o determina), não consigo concordar e cuja prática não consigo ver com bons olhos.
E acho que só concordarei com ela, podendo até acatá-la, se ouvir as mesmas pessoas que assim falam a exclamarem "Foda!" em vez de "Foda-se!".
Como (se...) costuma dizer, ou há moral ou comem todas/todas...

domingo, 10 de janeiro de 2016

Ainda se poderá dizer?

Lembro-me de ter ouvido, há muito tempo, a expressão "Não se bate numa mulher nem com uma flor", que tem duas vertentes: a primeira é de que nunca, em nenhuma circunstância, se bate numa mulher e a segunda é que isso não se faz nem mesmo com um objecto tão sugestivo e tão delicado com uma flor.
Hoje, porém, já não se deve poder dizê-la, porque seria decerto encarada como uma afirmação de discriminação sexual e censurada como tal.

sábado, 9 de janeiro de 2016

Presidenciais: onde está o Wally?


É possível que Marcelo Rebelo de Sousa tenha encarado as eleições presidenciais como um desafio, objectiva e subjectivamente.
Tinha, um dia, de se submeter a uma eleição nacional e fazer por ganhá-la. Com isso desmentiria os que o acusavam de ser só “treinador de bancada” com resultados infelizes quando desceu à arena política (câmara de Lisboa e AD), e culminaria a sua vida pública com o mais elevado cargo do Estado numa altura em que ele, vazio, ficava mesmo a jeito.
Por outro lado, e numa altura em que os resultados das eleições legislativas eram muito incertos, o presidente Marcelo seria, para o eleitorado do PSD e do CDS, a melhor das hipóteses se o PS chegasse legitimamente ao poder.
A sua candidatura era natural. Mas num espectro político que, por referência aos partidos, abrangesse parte o PSD, o CDS e uma parte do PS.
A sua vitória seria segura e talvez ainda mais segura se se afirmasse como uma candidatura individual e “independente”. O sistema constitucional português, nas suas boas intenções, reserva as eleições legislativas aos partidos e as presidenciais aos indivíduos: as candidaturas presidenciais são pessoais e não partidárias. 
Mas, no fundo, esta perspectiva é falaciosa. Nestas eleições presidenciais há dois partidos com candidatos próprios: o PCP e o BE. Por outro lado, o PS, que até oficialmente não tem candidato, consegue o prodígio de ter três candidatos: dois são militantes do PS e um é como se fosse, dependendo da ala do PS que esteja de turno nesse dia (Sampaio da Nóvoa).
Se a “direita” tem um candidato (Marcelo Rebelo de Sousa), a “esquerda” tem cinco (por ordem alfabética: Edgar Silva, Henrique Neto, Maria de Belém Roseira, Marisa Matias, Sampaio da Nóvoa). Depois há quatro candidatos, que oscilam entre o caudilhismo demagógica e a vaidade.
Destas dez figuras, as que realmente importam (e se a democracia permite esta espécie de feira das vaidades, ela também permite dizer que alguns candidatos são relevante e que outros, apesar do penteado ou do discurso, realmente não o são) são as do leque “esquerda”/”direita”, mesmo que a maioria dos cinco da “esquerda” tenham um discurso que revela a sua profunda ignorância dos poderes e do papel do Presidente da República em Portugal.
A fartura de candidaturas pode dar uma imagem pujante da “esquerda”. Mas essa imagem, a existir, só pode ser patética, e não apenas pela sua divisão e pela sua ignorância.
 
2 
 
A “esquerda”, com os seus cinco candidatos, poderá vencer as eleições presidenciais? Não, e não será por completo arriscado dizer que nunca o conseguirá fazer, nestas eleições, à primeira volta.
As candidaturas do PCP e do BE visam apenas a fixação dos respectivos eleitorados, com as suas versões algo troglodita das respectivas prestações nas eleições legislativas, com discursos mais caceteiros do que os seus chefes partidários.
O que dizem não é a pensar no exercício do cargo presidencial mas a pensar no que os militantes e eleitores do PCP e do BE querem ouvir. Poderá ser interessante especular sobre o que seriam os mandatos presidenciais de Edgar Silva e de Marisa Matias mas o assunto é mais sério do que isso, já basta o governo que existe actualmente e nenhum deles (nem as suas hierarquias partidárias) pensa na realidade que lá chegará.
E no PS? António Costa conquistou o Governo com uma frieza golpista que se julgava impensável no país dos “brandos costumes”. É possível que nesta fase, enquanto subsistem as ilusões, a escolha da candidatura presidencial fosse feita de maneira mais controlada e com todas as opções bem dentro do redil partidário.
Mas o mal já estava feito. Num retrato também simbólico daquilo que é e sempre foi o PS, os seus três candidatos dão voz a três sensibilidades diferentes: Sampaio da Nóvoa é o candidato da esquerda do PS, da sua “terceira via” actualizada; Maria de Belém Roseira é a candidata dos apoiantes do “bloco central” dentro do PS, de um sector mais conservador; Henrique Neto é o sucessor de muitos outros candidatos derrotados, que se ergueram de margens do PS para onde rapidamente voltaram, uma candidatura marginal que também vive do relativo êxito mediático do candidato e que, ganhando algum ímpeto, pode ir buscar mais votos aos sectores conservadores do PS e a algum eleitorado conservador (que não consegue satisfazer-se com Marcelo Rebelo de Sousa).
Em qualquer dos casos, as eleições presidenciais, pelo menos à primeira volta, serão uma derrota para o PS. Nem vale a pena escondê-lo: a soma dos votos obtidos pelos três candidatos deve ser lida, com alguma maleabilidade, em função dos resultados obtidos pelo PS nas eleições legislativas de Outubro do ano passado, mas também fragmentadamente: qual é a tendência das três que obtém mais votos? E aproveitá-los-á para uso interno?
 
3 
 
E Marcelo Rebelo de Sousa conseguirá ganhar as eleições? À partida, sim. Pode dizer-se que tem tudo a seu favor, sobretudo por comparação com os restantes candidatos.
Não é um desconhecido e a exposição mediática está assegurada, pelo menos desde que passou da rádio para a televisão. Conseguiu, diante das câmaras, substituir a postura do professor catedrático e autor de pareceres jurídicos por uma atitude mais simpática e mais afectuosa, moderando-se nos comentários e procurando mostrar que sabe de tudo um pouco, como um divulgador e não um comentador. E até pode ganhar um apoio mais emocional de quem o vê transformado no “bombo da festa” dos restantes nove. Por outro lado, não renegou objectivamente a “família” política e partidária e a popularidade que ganhou também lhe abriu portas na “esquerda”, apesar de se situar no campo da “direita” e não apenas no domínio político.
Mas é aqui que pode estar a sua maior fragilidade.
Da incursão na festa do “Avante!” em vésperas de se apresentar como candidato presidencial ao modo como se foi criando alguma distância relativamente ao PSD e uma aproximação cautelosa ao PS de Costa, Marcelo pode ter perdido apoios e votos entre os eleitores do PSD e do CDS. E, não sendo esse o seu eleitorado exclusivo, é com ele que Marcelo pode contar, nas eleições ou depois, se chegar à Presidência da República.
Esta situação pode levar à abstenção nas eleições de 24 de Janeiro ou à deslocação de votos… talvez para o único candidato que apresenta um perfil mais sério e mais conservador, que é o caso de Henrique Neto.
E se Marcelo não ganhar à primeira volta, ganhará à segunda? Poderá pensar-se que sim, claro, mas tudo dependerá do outro candidato que passar à segunda volta e dos votos que consiga ter por parte do eleitorado dos restantes perdedores.
Portanto, Marcelo precisa mesmo de ganhar à primeira volta. E de ser mesmo o Wally de que ainda anda à procura o eleitorado conservador e/ou mais avesso a aventuras políticas (como a deste governo “das esquerdas”). Ainda haverá tempo para isso?
 
(Publicado, em três partes, no Tomate.)

Que farão eles com o património termal? Nem sabem...

 
Começa a ser completamente transparente aquilo que parecia apenas uma evidência susceptível de confirmação: ninguém em Caldas da Rainha (Câmara Municipal, o que passa por ser a oposição, juntas de freguesia, a ridícula "nomenklatura" citadina) sabe o que há de fazer com o Hospital Termal e com os míticos e arruinados "pavilhões do parque".
Perdem-se em debates, em declarações de pias intenções,em pronunciamentos, em pedidos ao Pai Natal e não sabem por que ponta hão de pegar numa coisa para a qual não há no concelho (nem fora dele, no estado em que as coisas se apresentam) arcaboiço financeiro nem tão pouco intelectual.
Seria patético, se não fosse tão previsível.
 
 
 
Quem é que se arrisca a meter dinheiro nisto,
no estado em que estas veneráveis ruínas se encontram?

quinta-feira, 7 de janeiro de 2016

Reviver o passado na 5 de Outubro

 
O "Diário de Notícias", sempre o jornal do regime, e até o conspícuo "Observador" desfizeram-se em excitações com títulos como "Governo desfaz em 40 dias política de educação de Crato" e "o novo governo socialista reduziu a pó várias das medidas do anterior governo: na saúde, na educação, mas também na justiça".
Convém recordar que, há apenas dez anos, e no sector da educação, o PS defendia a estabilidade das políticas educativas e se opunha à prática corrente de transformar os alunos e as escolas em cobaias de ministros e secretários de Estado.
Mas agora, deitado fora o bom senso (nem se avaliam as políticas?!) e no "tempo novo" dos delírios políticos, é como se Sottomayor Cardia regressasse à 5 de Outubro, desta vez com o apoio dos sindicalistas do PCP, a quem só interessa o segmento dos professores contratados que ainda neles confia.
 


segunda-feira, 4 de janeiro de 2016

Notas em formato de "zapping": transições


The Affair - Devia ser a história de um caso amoroso mas lá conseguiu estender-se para ser uma história de (vários) namoros, tentando os produtores manter a chama do interesse televisivo acesa com um homicídio. Dominic West ("The Wire"), Maura Tierney ("ER") e Ruth Wilson não conseguem, só por si, sustentar uma série que (pelo menos a meio da segunda temporada) parece preferir o ambiente dramático de uma telenovela luso-mexicana e talvez se devesse intitular "Namoro". Mas já há terceira temporada encomendada, o que demonstra que o voyeurismo se vende bem (vista no canal TV Séries).
 
Arrow - A quarta temporada começou com algumas debilidades mas ao episódio 6 (na semana passada) já se notaram melhorias. É um jogo interessante ver como esta série se cruza com outras séries ("The Flash", a malograda "Constantine" e também a anunciada "Legends of Tomorrow") que nos trazem uma parte do universo de banda desenhada da DC, que bate a concorrente Marvel na televisão. Não se percebe é por que carga de água é que o AXN transforma o nome clássico de Arqueiro Verde (nome que ficou de certa forma fixado em língua portuguesa) em "Flecha Verde". Pode ser mais rigoroso relativamente ao original ("Green Arrow") mas com esta opção perdem-se algumas referências (vista no AXN).
 
Downton Abbey - Acabou, portanto, num episódio onde tudo se atamancou e se resolveu apressadamente, chegando ao fim com seis temporadas e desejos mal contidos de um filme de longa-metragem, que serviria não se sabe bem para quê. Foi uma boa ideia e de êxito seguro e duvida-se de que cansasse os seus espectadores mais entusiastas mas o mundo das séries de televisão tem regras de mercado que nem sempre parecem lógicas. E certas soluções encontradas para a história da família Crawley também não tiveram grande lógica, já agora. (vista no canal Fox Life). 

Engrenages - É uma das melhores séries policiais francesas contemporâneas e a sua quinta temporada passou quase clandestinamente na RTP2 no verão passado com o título "Um Crime, Um Castigo". Já aqui me referi a ela, pelas qualidades intrínsecas e pelo facto de poder ser um modelo para uma série portuguesa. Os elogios continuam a justificar-se (vista numa edição em DVD da BBC de 2014, legitimamente adquirida).
 
Fargo - Com a segunda temporada, "Fargo" revelou-se uma das melhores séries do momento, talvez melhor do que a primeira temporada e seguindo a lógica e o estilo do filme que lançou os irmãos Joel e Ethan Coen, "Sangue por Sangue". No modelo da história completa por temporada, bateu a segunda temporada de "True Detective", combinando um traço irónico com uma grande dose de violência explícita em jeito de retrato de época (vista no canal TV Séries).
 
The Flash - Apareceu depois de "Arrow", oriunda dos mesmos produtores, e conseguiu ser melhor do que essa série. A primeira temporada passou também clandestinamente na RTP mas da segunda nada se sabe, o que é pena.
 
The Knick - Um hospital no início do século XX em Nova Iorque, um actor bem conhecido (Clive Owen) e um realizador consagrado e inventivo (Steven Soderbergh): eis "The Knick", uma série que por enquanto se fica apenas pela segunda temporada. Foi um bom trabalho televisivo, que merecia outra atenção (vista no canal TV Séries).
 
 
 
Clive Owen em "The Knick": "ER" e "House" no princípio do século XX

Ano novo, vida velha: um aumento que paga a má gestão e a incompetência

 
O preço da água aumenta este ano no concelho de Caldas da Rainha. Para a Câmara Municipal, é um aumento "só" de 4,8 por cento em média e, garante o presidente camarário que infelizmente nos calhou, um aumento de "aproximadamente" um euro (1€) para 90 por cento dos clientes.
Pode haver um milhão de justificações teoricamente bondosas para este aumento mas, em termos políticos, nada o justifica. A começar pelas perdas registadas (só as registadas) de água da rede pública que é responsabilidade dos Serviços Municipalizados de Água e Saneamento: 37 por cento.
Ou seja, da água comprada pela Câmara Municipal de Caldas da Rainha à Águas do Oeste, há 37 por cento que se perde e, como tal, não é paga. Isto significa má gestão e incompetência. Mas, para a Câmara Municipal de Caldas da Rainha, significa um aumento do preço.
Vamos a um único exemplo prático, a que já aqui me referi, e que é prática velha: durante cerca de três semanas houve uma ruptura séria na rede pública numa rua do interior. Os Serviços Municipalizados foram avisados, a reparação demorou a fazer-se... e foi feita à noite (e já me garantiram que seria uma prática corrente porque esse trabalho é pago como "horas extraordinárias").
Duas semanas depois, o pavimento está por reconstruir e já pouco resta da rua.
 
 
Para que servem as oposições?
 
A decisão de aumentar o preço da água esconde uma falácia: o P.V.P. da água até pode aumentar pouco mas o valor final da factura não inclui apenas esse aumento; inclui também o aumento das parcelas das várias taxas que, no fim, correspondem em geral a 50 por cento do valor da factura. Ou seja, há um aumento duplo: do preço da água e, por percentagem, das taxas cuja verdadeira utilidade nunca se percebeu.
Este aumento é o melhor símbolo do estado a que as coisas chegaram, politicamente, neste concelho, e a menos de dois anos de novas eleições autárquicas.
Neste caso, o PS, o CDS e o PCP votaram em conjunto contra o aumento do preço da água (o que me parece ser inédito) da câmara PSD e o MVC deu um novo passo no seu processo autofágico e votou a favor (a prenunciar, ao que se diz, a sua absorção pela candidatura do PSD em Setembro de 2017).
Além deste aumento, que na prática serve para cobrir o prejuízo das perdas de água de uma rede pública em decomposição, o ano de 2016 traz consigo a continuação da incompetência de que este câmara tem dado mostras: obras mal feitas na capital do concelho com o interior votado ao abandono, projectos falhados (como é o caso do ridículo estacionamento subterrâneo que era a "jóia da coroa" da Câmara), ausência de iniciativas para a reabilitação do concelho e a canalização de todos os recursos para o "buraco" camarário que vai ser o futuro do hospital termal entregue a esta gente.
Tem sido assim graças também ao défice de atenção de que vão fazendo prova as oposições no teatro que representam no pequeno palco da elite política da capital do concelho. Até quando?
 

A rede pública de abastecimento de água tem perdas de água de 37 por cento.
O aumento do preço da água tapa o prejuízo mas não a incompetência,
tal como a terra e areia tapam os buracos nas ruas destruídas pelas rupturas sucessivas.

domingo, 3 de janeiro de 2016

"Perdeu-se", "fugiu", "desapareceu": o triângulo das Bermudas da incúria





 
Moro numa casa com terreno à volta que está, todo ele, rodeado por uma cerca por opção própria.
O meu cão (e não é o da fotografia) anda à vontade lá por fora mas não sai da propriedade. Quando se abre o portão, fica contido no exterior ou dentro de casa (para não passar para o lado de fora nem haver nenhum acidente). Teve treino canino durante algum tempo (e nunca será demais elogiar o trabalho de quem se dedica a treinar cães e, no nosso caso, os especialistas da Casa do Niko, em Caldas da Rainha) e é razoavelmente obediente. É de uma raça utilizada na caça (e não, não sou caçador) e o olfacto parece funcionar sozinho, em regime de radar, o que faz com que o cão vá atrás de qualquer cheiro mais intrigante. E nunca, mas nunca, deixa de andar à trela fora de casa.
É por tudo isto que me faz uma grande confusão que haja cães que se "perdem", "fogem" ou "desaparecem", grandes ou pequenos, com raça ou sem raça, moradores talvez mais fora de casa do que dentro, com donos idiotas que acreditam que os "seus" cães andarão sempre atrás deles se os soltarem ou que são postos à porta de casa para as suas voltinhas higiénicas porque dá menos trabalho do que andar com eles pela trela ou que, se forem, hão de voltar.
Só que a questão básica é esta: à solta fora de casa e sem trela, os cães afastam-se.
Vão atrás de um cheiro, de outro cão, de qualquer pormenor que os atraia, podem ser atropelados por um carro, perder simplesmente as referências quanto ao local de onde partiram, ser levados por alguém e, talvez, com a melhor das intenções. E depois são cães abandonados (é outra forma de abandono, afinal), perdidos, desorientados, condenados a fins tristes e miseráveis.
O triângulo "perdeu-se" - "desapareceu" - "fugiu" é o retrato da incúria de quem não sabe, porque não quer, tratar de seres vivos que decidiu, sabe-se lá porquê, acolher (e seres vivos que têm uma sensibilidade que os faz às vezes gostar de quem nem sequer os trata bem). E se não for esse o caso, usem ao menos de alguma honestidade: em que circunstâncias é que isso aconteceu? Conseguem confessá-las?

Cá estou


Alguns frequentadores deste espaço manifestaram a sua curiosidade pela minha ausência de uma semana e pela escassez de apontamentos, sobretudo no último mês.
Houve quem, simpaticamente, perguntasse ao que se devia a minha ausência e houve quem, localmente, se regozijasse, na esperança de não continuar a ficar com as orelhas a arder. Aos primeiros digo que cá estou e aos segundos que ainda foi desta que se livraram de mim.
A explicação é simples: não fiz férias nem  me ausentei; estive ocupado, como até este momento nunca estivera desde que, de 2007 para cá, já traduzi mais de meia centena de livros, com a tradução do monumental "The Invention of Science".
E, terminado este trabalho, e no prazo previsto, cá estou eu de regresso.


"The History of Science",
de David Wootton