domingo, 29 de maio de 2016

A anormalidade governamental

No regime democrático em que ainda vivemos, um governo normal que quisesse contrariar, combater ou anular a prática de dezenas de anos do "contratos de associação" faria duas coisas:

1. Um retrato exacto da situação da rede escolar (sectores público e privado) à escala nacional com base em indicadores económicos rigorosos (cujos elementos, no que às escolas se referem, não podem deixar de estar na posse do Ministério da Educação; e
2. Uma acção inspectiva (conduzida pela Inspecção-Geral da Educação) ao conjunto das escolas privadas beneficiárias dos "contratos de associação" ou àquelas sobre as quais recaem suspeitas de procedimentos ilícitos.

Só depois é que proporia correcções ou alterações, ou apenas uma confirmação, aos "contratos de associação". E nunca se lançaria numa espécie de cruzada invertida contra um sector onde, tal como na rede escolar pública, existe seguramente tudo, do muito bom ao muito mau.
Só que este governo não é um governo normal.
É um governo tolhido por preconceitos ideológicos, falta de dinheiro para satisfazer toda a população, compromissos políticos que o tornam refém de um extremismo político (a extrema-esquerda, onde o PCP se deixou alegremente encaixar), crente em que a "paz social" será comprada pelos favores feitos aos sindicatos.
A actual guerra movida contra as escolas básicas e secundárias à pala dos "contratos de associação" (a que nunca pessoas racionais e inteligentes deveriam, pelo menos por pudor, dar cobertura...) teve três motivos:

1. Poupar algum dinheiro do que é gasto na rede escolar, em geral, na perspectiva duvidosa mas até agora infundamentada de que a rede pública chega para todas as necessidades;
2. Criar uma imagem de combate político que ajuda a desviar as atenções de outros problemas mais concretos e mais prementes; e
3. Pelo aumento da população escolar, com o simples desvio de alunos da rede privada para a rede pública, garantir emprego aos professores que não o conseguem ter devido à quebra generalizada da natalidade desde há pelo menos duas décadas e que constituem hoje o essencial da federação sindical do PCP (a Fenprof), que é mais um dos instrumentos deste partido na "luta de rua".

A anormalidade governamental gerou, como não podia deixar de acontecer, um clima de revolta por parte do sector atingido que, como também não podia deixar de acontecer, não conseguiu reagir com racionalidade.

Aliás, bastaria a forma como terá sido feito um alegado estudo governamental sobre o assunto (e é fundamental para o perceber o artigo de José Manuel Fernandes, que conhece bem o sector, no "Observador") para perceber a debilidade da motivação governamental no âmbito que realmente interessa: a política educativa (ver o quadro em baixo).
Se, por agora, a guerra dos "contratos de associação" se transformou numa sucessão de batalhas sem fim à vista, chegando a pôr em trincheiras opostas o Governo e a Igreja, pode dizer-se que o pior ainda está para vir.
Os quarenta anos de democracia mostram que, quando menos se espera, um problema no sector da educação (que poderia ser resolvido ou atalhado por medidas de política adequadas e consensuais) se transforma numa crise grave com consequências diversificadas.
O ano lectivo de 2016/2017 não tem, por isso, um começo tranquilo assegurado.



Um quadro revelador



Este quadro parece servir para justificar o fim ou a redução dos "contratos de associação" no concelho de Caldas da Rainha. É bizarra a referência ao "tempo de deslocação a pé", é estranha a ignorância relativa aos transportes públicos (que, na capital do concelho, servem as escolas públicas e privadas) e é ainda mais intrigante a sugestão de que poderá haver alunos deste concelho desviados para o concelho vizinho de Óbidos (sem indicar as zonas de origem). Isto acontece porque, segundo se disse e não foi desmentido, o que serviu para esta medida de política educativa foi o Google Maps. E é bem possível porque o estudo(?) que sustenta a guerra, que só foi conhecido depois de ela se ter iniciado, é uma indigência atroz.

quinta-feira, 26 de maio de 2016

Campanha eleitoral

"Jornal das Caldas", edição de ontem, 25 de Maio: o presidente da Câmara Municipal de Caldas da Rainha, Tinta Ferreira, candidato do PSD às eleições autárquicas de 2017, aparece em 3 fotografias; o seu vice-presidente, Hugo Oliveira, também aparece em 3 fotografias.
Não se conhecem, nesta data, os candidatos dos restantes partidos.

terça-feira, 24 de maio de 2016

Não vale a pena


Em dez anos, entre 2004 e 2014, escrevi e publiquei dez romances policiais, ou “thrillers”.
Não os publiquei por minha conta, não fiz auto-publicação ou co-publicação (as varinhas mágicas que transformam tudo em “autores”). Aliás, nunca o faria.
Todos os dez livros que escrevi passaram pelas mãos de pessoas com responsabilidades de direcção editorial nas três editoras que me acolheram: Temas e Debates/Círculo de Leitores, Asa/Leya e TopSeller/20|20.
Nos dez livros, abordei temas diversos relacionados com a realidade social, política e judicial em Portugal. Ocupei-me do “processo Casa Pia”, da guerra colonial, o 25 de Novembro, da corrupção nas autarquias, das irregularidades financeiras, do poder dos banqueiros e de muitos outros aspectos.
Não há em Portugal, nem houve, autor como eu que o fizesse, numa linha ficcional que está longe da melancolia tradicional da literatura portuguesa e próxima da dinâmica da literatura anglo-americana. Fi-lo por gostar do género e, apesar de dominar bem as técnicas da escrita e da narrativa ficcional, nunca quis procurar o êxito pelas modas: nem o “’thriller’ histórico”, nem o “porno para mamãs”, nem as narrativas confessionais emocionais. (E nunca vi que houvesse “concorrência” à altura.)
Todos os livros foram, em maior ou menor grau, e em circunstâncias diferentes (até mesmo de promoção), bem recebidos por quem os leu. Reuni uma boa colecção de opiniões favoráveis e muito favoráveis.
Não fui às televisões (não o desejando, pessoalmente, ajudaria às vendas).
Nunca fui convidado para nenhum “festival” literário, onde só parecem ter lugar os amigos, os amigos dos amigos e, em jeito de círculo fechado, os nomes que mais vendem e que, ao mesmo tempo, publicam textos menos abertos.
Houve manifestações de interesse e projectos de adaptação de alguns livros ao cinema. Eu próprio fiz algumas diligências para concretizar o que seria óbvio nos países de língua inglesa e em alguns países europeus, que seria o aproveitamento das histórias e das personagens para séries de televisão. Nada se concretizou.
Comercialmente, os meus livros não vingaram. As vendas foram modestas e, em primeiro lugar, não entusiasmaram editores, nem mesmo os que demonstraram maior interesse, maior apoio e maior disponibilidade para afirmarem uma ficção policial portuguesa de qualidade. E também não entusiasmaram o autor.
Porque, se as vendas não garantem, em tempo razoável, o retorno do investimento dos editores, o autor também não é beneficiado. Ou seja, em termos práticos, eu posso estar a escrever uma história durante quatro ou seis meses mas esse trabalho nunca será devidamente remunerado se não houver um mínimo de êxito comercial. E, tendo outro trabalho remunerado, estar a escrever uma história minha significa que também não estarei a fazer esse trabalho durante o período de escrita.
Em 2014 parei de escrever. Ficou uma história por acabar (mas os leitores mais atentos têm um “cheirinho” da conclusão nas últimas páginas) mas as circunstâncias da vida literária são essas: a qualidade portuguesa tem menos saída do que o rebotalho estrangeiro.
Ainda pensei em escrever parte das aventuras da minha personagem Ulianov, nos seus tempos do KGB na antiga União Soviética, mas o aparecimento de outras histórias passadas no mesmo ambiente não recomendaram que desenvolvesse esse projecto.
Há uma história, sobre jornalismo e jornalistas em Portugal, que comecei a escrever (e que não é um “thriller”, apesar de tudo) mas que subordinei ao trabalho directamente remunerado que faço.
Há outras ideias mas nem chegaram ao “papel”. Não me queixo, nem alguma vez o sentiria, do famoso “writer’s block”. Aliás, não penso que alguém que tenha imaginação, criatividade e disciplina de escrita sofra dessa maleita. Só que não vale realmente a pena, não vale nem o esforço nem o trabalho, nem o investimento.
Devo, no entanto, dizer que tenho a firme convicção de que pode haver uma ficção policial portuguesa “pura”, de que haverá decerto outros autores que se revelarão e que editores mais atentos poderão aproveitar e de que o “thriller” português faz falta à literatura portuguesa (onde, aliás, é comum a captura dos mecanismos do género para aumentar o efeito dramático). Mesmo que a generalidade dos editores e uma elite intelectual que gosta muito do seu umbigo (e de poucos umbigos alheios) continuem a considerar o “thriller” e a ficção policial como uma literatura que parece mal: sangue, mortes violentas, gente pouco recomendável, polícias & ladrões ou mesmo pior, heróis?! Credo, é demasiado “popular”! Salvo se vier do estrangeiro.
Não é um caso único. O facto de não haver lugar para a literatura policial portuguesa em Portugal é apenas mais um exemplo de outras coisas que não temos (cinema e ficção televisiva de alta qualidade, banda desenhada, por exemplo).
Por tudo isto, neste domínio de impossibilidades, posso dizer que já cumpri o meu dever.

















domingo, 22 de maio de 2016

Porcos com asas ou as asas do desejo




Se as vacas tivessem asas e voassem,
iríamos precisar de chapéus-de-chuva gigantes.


Embora o bovino, especificamente a vaca, seja um animal sagrado em algumas religiões, o certo é que a figura tradicional portuguesa, quando se aplicam asas a um mamífero que não seja um anjo (nem um morcego), é a do porco.
Haverá decerto para isso uma boa explicação social e até cultural. 
O porco, e atente-se logo no nome, é um animal rasteiro, mais próximo do solo do que uma vaca.
É praticamente omnívoro, o que significa que come tudo, incluindo restos de alimentos humanos (e até os próprios humanos, segundo parece).
Talvez por causa da sua posição mais rasteira, parece rastejar e o seu habitat não é o terreno limpo e mais ou menos verdejante dos bovinos mas o chão sujo. 
As pocilgas “naturais” não são modelos de limpeza como o poderão ser as industriais. A criação de porcos doméstica implica a permanência do animal numa mistura de lama e de excrementos. A limpeza do porco, neste caso, só se alcança depois da matança.
Considerado néscio, em termos de raciocínio, o porco já teve uma pequena presença na política portuguesa ou, pelo menos, no seu imaginário: consta que, antes do 25 de Abril, um grupo oposicionista largou no Rossio um porco vestido de almirante, em jeito de insulto ao então Presidente da República, que era almirante.
Considerando inteligente, o porco não consegue elevar-se acima das suas pequenas pernas.
Terá algum raciocínio elementar mas não voa. As asas, a tê-las, teriam de ser poderosas e vigorosas, capaz de levantar o peso do seu corpo, que em nada é aerodinâmico.
É a mistura desta quase impossibilidade com a porcaria, em que é obrigado a vegetar, que faz do porco com asas e com capacidade de voar uma impossibilidade feita de ironia. Perigosa, claro: se se associa ao porco uma incontinência rectal (ou a descontração animal relativamente ao assunto), é mais alarmante a ideia de ter porcos a voar por cima de nós do que gaivotas, pombos ou outras aves que parecem ter um B52 no posterior.
Imagem absoluta da improbabilidade, o porco com asas e capaz de voar é também a representação ideal do que, por exemplo, se receia quando aplicado à vida política: que o bicho, capaz de se deslocar contra natura, se alcandore a locais cimeiros onde nunca poderíamos esperar ver um porco. 
Nem um bovino, claro.

(Publicado no Tomate)


quinta-feira, 19 de maio de 2016

Lula, Sócrates, Eduardo dos Santos - o que os une?



Para conhecer melhor uma realidade sombria


O relacionamento entre Portugal, Brasil e Angola envolveu nos últimos anos  três altos dirigentes de Estado dos três países (José Sócrates, Lula da Silva e José Eduardo do Santos) e uma entidade financeira (Grupo Espírito Santo) e uma imensa nuvem de suspeitas de actividades criminosas onde, de forma directa ou indirecta, todos eles convergem.
Se ainda houvesse verdadeiro jornalismo de investigação em Portugal, a ligação entre os três homens de Estado já teria sido devidamente escrutinada. Mas não há.
E não é só por essa falta mas também pela qualidade intrínseca da análise que se destaca  neste caso o recente livro "Os Três Magníficos - Sócrates, Lula da Silva, Eduardo dos Santos, Vidas e Negócios Paralelos", escrito por Rui Verde  (Rui Costa Pinto Edições).
Professor de Direito, Rui Verde tem dedicado parte do seu tempo a abordar questões da política portuguesa e angolana, em livros e no mundo digital, e "Os Três Magníficos" reflecte o seu conhecimento das circunstâncias que aborda e a qualidade de uma escrita directa, clara e esclarecedora. 


"Cidade em festa"... e entradas que são uma vergonha


A "festa" não tapa os buracos...

À pala do feriado municipal (15 de Maio), o "Jornal das Caldas" menciona na primeira página "Homenagens, inaugurações e concertos", em ambiente festivo.
Depois, são várias páginas que dão ao presidente da Câmara Municipal de Caldas da Rainha a oportunidade de figurar em 14 (catorze) fotografias, como se o jornal fosse um mero jornal de campanha da sua candidatura à reeleição.
É pena, no entanto, que lá no interior apareça discretamente a notícia de mais um dos debates entre as várias forças políticas do concelho a convergirem numa constatação muito óbvia: a necessidade "de melhorar as entradas na cidade".
Ou seja, tapar os muitos buracos e pisos desalinhados que caracterizam as cinco entradas que tem a capital do concelho. PS, CDS, MVC, PCP e BE (inexistente na Assembleia Municipal) convergem aqui na observação de que as vias de entrada são miseráveis.
É uma negligência camarária para a qual não há desculpa, nem sequer a que ergue o representante do PSD, que invoca as "urgências" (invisíveis...) do Hospital Termal (fechado) e "do Parque e da Mata", onde também não houve intervenção que se visse. Mais valia estar calado...



quarta-feira, 18 de maio de 2016

A incompetência suspeita dos Serviços Municipalizados de Caldas da Rainha

1 - Em 31 de Março (deste ano) os Serviços Municipalizados de Caldas da Rainha enviaram-me uma factura (que demorou 7 dias a percorrer os 10 quilómetros) para ser paga em 20 de Abril. (A contagem foi feita "por estimativa" apesar de a leitura do contador ter sido fornecida em tempo.)

2 - No dia 28 de Abril foi-me enviada nova factura para ser paga em 18 de Maio no valor de 18,89€. A leitura foi feita pela "empresa" ou foi aceite a enviada. A factura foi paga em 13 de Maio.

3 - Com data de 6 de Maio (cerca de uma semana depois da anterior) chegou-me na segunda-feira, dia 16 (desta vez a viagem da carta foi feita ao ritmo de um quilómetro por dia...), mais uma factura, desta vez no valor de 61,89€. A diferença de valor até poderia ser justificada pela rega mas há um factor curioso: é que esta factura inclui, discretamente, o valor dos 18,89€! É claro que à data da emissão ainda não tinha feito o pagamento mas é estranha a pressa do envio da nova factura. E se, por acaso, não examinasse bem a factura (com cuidados redobrados, que esta gente não é de fiar), até me arriscaria a pagar... o que já fora pago.


Pode haver milhentas razões técnicas para esta duvidosa embrulhada mas, para mim, é de incompetência que se trata.
Tudo é possível num serviço que não cuida da degradação da rede pública de abastecimento de água e onde as reparações das rupturas são deixadas para o período em que o seu pessoal já pode receber horas extraordinárias.
Até mesmo, por hipótese, o envio de uma factura "por estimativa" relativa, por exemplo, a Julho quando ainda estamos em Maio.
E se isto não é incompetência, só pode ser pior quando na prática se tentam convencer as pessoas a pagar por duas vezes...



terça-feira, 17 de maio de 2016

domingo, 15 de maio de 2016

TV: "Game of Thrones", "11.22.63" e "Billions"




"A Guerra dos Tronos" (canal SyFy) arrebitou, nesta sexta temporada.
Talvez por já estar a caminho do fim e se impor uma conclusão (quem é que fica com o Trono de Ferro?), o ritmo acelerou e foram introduzidos elementos mais emocionantes: a ressurreição de Jon Snow (que talvez não seja filho bastardo de Ned Stark), a captura de Daenerys pelos Dothraki, a irreprimível ascensão do High Sparrow (não soa nada bem "Alto Pardal"), para cuja criação o ator Jonathan Pryce disse ter-se inspirado no Papa Francisco...
Tudo isto faz de cada episódio desta temporada uma aventura de coisas inesperadas. São só dez episódios por temporada e é pena





"22.11.63" ou "11.22.63" (a série) ou "11/22/63" (o romance original) segue razoavelmente a linha da história da torrencial historia de Stephen King, condensando com habilidade as 850 páginas, na edição de bolso, em 80 horas de televisão (e seguimos aqui a indicação do IMDB porque a exibição no canal Fox foi bastante confusa).
Só que, respeitando o fim melancólico do romance (não é possível mudar o passado, por melhores que sejam as intenções...), a série perde o pé e a dinâmica da narrativa perde-se nesse final.
No texto original, Stephen King ainda criou uma espécie de câmara de descompressão entre as peripécias de Jake Epping e a sua triste constatação mas, na série, a transição é demasiado abrupta
"11/22/63" esteve para passar ao cinema, com realização de Johnatan Demme. Felizmente, porque uma hora e meia ou mesmo duas não dariam para a história. Escrevi sobre este romance em Novembro de 2012 aqui.




Em Billions (TV Séries), um procurador distrital (Paul Giamatti) persegue um financeiro (Damien Lewis), suspeito de numerosos crimes de natureza económica.
É uma boa história, que se vai construindo com emoção ao longo de onze episódios para depois cair abruptamente no último, o 12.º, com diálogo a mais e repetitivo.
Fazendo lembrar "Damages" mas sem a sua perfídia e a sua mestria técnica, Billions segue-se bem e deixa alguma curiosidade relativamente à segunda temporada, já anunciada mas ainda não calendarizada.

Passear cansa






O manual do bom jornalismo




Nunca houve, no relacionamento (ou relação) entre o então primeiro-ministro e a ainda jornalista uma coisa do género "Espera aí que tenho de ir ali ao multibanco", ou "Preciso de um cheque". Nunca a jornalista ouviu os telefonemas das "fotocópias" e da versão socrática dos "robalos" de Vara. Nunca a abundância de "cash" suscitou qualquer curiosidade. A "namorada" nunca "fez ideia".
Há quem diga que o jornalista deve obedecer a uma espécie de missão divina, estando sempre activo e actuante 24 horas por dia, empenhado em fazer o bem contra o mal, em denunciar a inverdade e lutar pela verdade.
Não foi essa a prática da jornalista.
Também não foi essa a prática do órgão de comunicação social que aceitou na íntegra e com todas as honras a confissão de Fernando Câncio em estilo wertheriano adaptado, sem sequer se reservar o direito de fazer perguntas óbvias.
O também jornalista Luís Osório, na edição do "Sol" de ontem, resume  a coisa a "quadrilhice, traição, inveja e dor de corno". Devia ter acrescentado "deontologicamente duvidosa".


(A autora, que parece não se rever na forma como a "Visão" lhe publicou o texto, disponibilizou-o aqui. A leitura é um pouco entediante mas pode interessar como "matéria de facto".)

sábado, 14 de maio de 2016

Com adversários destes, nem precisa de ir a votos...


O ex-presidente Fernando Costa desistiu de voltar a candidatar-se à Câmara Municipal de Caldas da Rainha nas eleições autárquicas de 2017. 
O PS, o CDS e o PCP, a passo de caracol, remetem as suas decisões para mais tarde ou mesmo já para o ano.
Do fundo da sua inutilidade, o BE não se compromete com nada e até deixa a hipótese de "falar" sobre uma "candidatura conjunta" (decerto que apenas na esperança de poder regressar ao lugar perdido da Assembleia Municipal). E o MVC faz de conta que nasceu ontem e refugia-se em vaguidades.
Ou seja, o actual presidente camarário (que representa, no concelho, o pior que o PSD pode ter) já parte com uma dupla vantagem: detém o poder autárquico e não tem concorrência.
Só lhe ficava bem agradecer aos outros partidos o apoio objectivo que vão dar à sua miserável vitória...


"Gazeta das Caldas", 13.05.16

sexta-feira, 13 de maio de 2016

4 factos indesmentíveis sobre o ISP (e o IVA)



1. O Governo PS/BE/PCP decidiu baixar o Imposto sobre os Produtos Petrolíferos em 1 cêntimo. O aumento do ISP por este mesmo governo já levou a um aumento médio dos preços dos combustíveis no valor de 11 cêntimos. Dado como uma "boa notícia" pelo próprio chefe do Governo, esta descida irrisória equivale a uma escarradela política na cara dos cidadãos. Haverá quem goste de que lhe cuspam na cara.

2. Segundo o próprio Governo, a redução de 1 cêntimo no ISP levará a uma perda de receita fiscal no valor de 44 milhões de euros até ao final do ano.

3. O Governo vai baixar o IVA na restauração (numa perspectiva de "recuperação de rendimentos", segundo o BE, como se o IVA não fosse um imposto cobrado aos clientes e entregue ao Estado...). Vai perder 175 milhões de euros de receita do IVA graças a isso.

4. O aumento dos combustíveis prejudica toda a gente, em todo o País, desde os que têm os melhores e mais modernos carros aos idosos que, no interior, usam viaturas muito velhas para se deslocarem (por falta de transportes públicos). A descida do IVA na restauração beneficia os patrões do sector e não servirá sequer para baixar os preços das refeições que, de qualquer modo, só são pagas por quem vai aos restaurantes.


O chefe disse, na TV e com ar de gozo, que era este a dar a "boa notícia",
mas o ministro mandou um ajudante...




(Sobre o IVA da restauração, o que escrevi pode ser lido aqui.)

quarta-feira, 11 de maio de 2016

Costa & Sócrates, SA, Martins & Sousa, Lda

José Sócrates precisa de António Costa e António Costa precisa de José Sócrates. 
O antigo primeiro-ministro arguido e suspeito de vários crimes precisa da protecção do actual primeiro-ministro. Por ser primeiro-ministro e por ser quem manda no interior do PS. O actual primeiro-ministro precisa de Sócrates pela influência que ele ainda tem dentro do PS, pelo seu carisma de uso interno de “resistente” e, sabe-se lá, se do dinheiro que ele ainda pode ter. Ou o tal Santos Silva por ele.
Costa e Sócrates saem do mesmo ventre do PS mas constituíram famílias distintas. Silva Pereira, o ex de Sócrates que agora assessora Costa para o congresso do partido que também parece ter beneficiado dos favores do primeiro em Paris, é o elemento de ligação.
O convite feito por Costa a Sócrates para a inauguração de um túnel rodoviário é, bem à vista de toda a gente e numa cerimónia pública, a expressão de um pacto e, obviamente, um gesto de desagravo político: que a justiça o trate bem, podia ter exortado António Costa neste preciso momento.
Costa acolheu Sócrates e mostrou-o ao sistema judiciário como se erguesse um sinal de “stop”. Sócrates é arguido por suspeita de crimes económicos relacionados com as funções públicas que exerceu e não por ter sido apanhado a guiar sem carta ou em excesso de velocidade e essa circunstância, independentemente do direito à presunção da inocência, recomendaria ao actual chefe do Governo alguma decência política. Até porque parte do sistema judiciário depende, de uma forma ou de outra, do Governo.
Por outro lado, este reforço pouco decente do PS (de onde, estranhamente, desapareceu a voz de Mário Soares) devia inquietar os seus parceiros políticos. Costa só precisa do BE e do PCP enquanto o PS não for suficientemente forte e não tiver um controlo satisfatório sobre vários sectores. Depois, como é evidente, livrar-se-á deles e sem ponta de escrúpulo.
Não deixa ainda de ser estranho que Catarina Martins (que vai fazendo de vice-primeira-ministra dia sim, dia não) e Jerónimo de Sousa (que às vezes parece arder de ciúmes), se tenham conformado com a situação.
Aceitam tudo e mais alguma coisa, engolem sapos em versão garganta funda e assinam de cruz acções, medidas e intenções que já vão muito para lá da decência democrática. E não pestanejam perante a reabilitação política de Sócrates feita pelo chefe do “seu” governo. 
Mas o certo é que se, por enquanto, têm lugar numa espécie de “mesa dos pequeninos” do banquete governamental, poderão ficar um dia sujeito às migalhas que o PS unido fará o favor de lhes dar. Quando toda a “nomenklatura” socialista estiver saciada. Obviamente.


domingo, 8 de maio de 2016

Dão: notas de prova


Aprendi com um mestre que é quase imprescindível ir ao terreno numa matéria como o vinho. Sobretudo numa região de que se gosta, e foi do Dão que eu aprendi a gostar desde que por volta de 1989, provei um Dão tinto de 1973 do Centro de Estudos Vitivinícolas de Nelas. Era melhor, garanto, do que o Barca Velha, de que bebi o suficiente para reforçar a minha sensação de que o Dão consegue fazer bem melhor.
O Dão tem sido, nestas explorações, o meu alvo de eleição há muitos anos e beneficiei sempre de boa companhia, o que é essencial quando se trata de falar sobre vinhos e comidas (e outros aspectos da vida, que ficam no palácio da memória quando as pessoas já não estão). E de procurar o que há de novo, confirmar o muito bom que já se conhece, ir aos restaurantes onde já se sabe que é bom e tudo numa zona geográfica que seria a minha outra escolha se não me tivesse mudado para o Oeste (e por influência, também, de quem me ensinou o fundamental sobre o vinho).
Nunca fui beneficiado, como jornalista, pelas ofertas de produtores, engarrafadores e distribuidores (também não trabalhava nessa área, no extinto semanário "O Jornal", onde vi muitas caixas de vinho depositadas para oferta aos "especialistas" do sector) e isso também me fez perceber a importância de ir procurar. E de comprar, claro. Mas tentando provar antes disso, o que nem é difícil.
Há quem considere (como aconteceu com um produtor de uma casa que já teve altos e baixos e onde comprei muito vinho ao longo de vários anos, mas agora já não) que não se pode dar a provar ao visitante. Para essa gente, que prefere oferecer garrafas à imprensa porque "sai sempre", o cliente interessado deve ser um bêbedo ou alguém que quer beber à borla.
Não deixa de ser significativo que, nesta minha viagem mais recente, as três novidades que mais me agradaram foram compradas depois de provadas. Se não tivesse provado, talvez não tivesse comprado.
Vamos então às notas de prova (das quais estão ausentes os ridículos registos de sabores florais, de compotas, de suor de cavalo e de outras preciosidades).

Casa dos Cunhas de Santar - Nature Tinto 2012


O Nature é um vinho biológico, feito com as castas Touriga Nacional e Tinta Roriz, sem estágio em barrica e com estabilização natural.
É uma das marcas da Dão Sul/Global Wines e foge, claramente, ao sabor padronizado da maior parte dos seus vinhos. Foi uma surpresa pelo seu carácter robusto e genuíno.
A prova fez-se à mesa do restaurante Quinta de Cabriz, em Carregal do Sal, propriedade da mesma empresa.
O restaurante é simpático e de muito bom nível, com a particularidade de a lista de vinhos ser composta pelos vinhos da Dão Sul a preços convidativos. É uma forma inteligente de os promover em ambiente adequado e é inspirador para a visita à loja, no mesmo local.



Quinta do Escudial - Tinto Reserva Vinhas Velhas 2009

Foi pelo Nature que chegámos ao Vinhas Velhas da Quinta do Escudial, em Vodra, na zona de Seia.
A Quinta do Escudial aposta em vinhos sem madeira e este Reserva 2009, muito robusto e saboroso, transmite integralmente todas as sensações dos vinhos do Dão. Foi feito com Touriga Nacional, Alfrocheiro, Jaen e Tinta Roriz.
Na ocasião provou-se também o branco de 2015, que é soberbo. Nestas primeiras impressões, a Quinta do Escudial marcou pontos em grande estilo.








Centro de Estudos Vitivinícolas do Dão - Branco 2012



O Centro de Estudos Vitivinícolas do Dão (CEV) em Nelas, criado em 1946, é de certa forma a sede histórico-científica do vinho do Dão.
É um departamento do Ministério da Agricultura que tem servido de apoio à produção local, com critérios de qualidade rigorosos. Dispondo de vinhas próprias, engarrafa os melhores vinhos que produz e tem venda ao público, em quantidades reduzidas.
Este branco de 2012, feito de Encruzado e com outras castas brancas da região, é um excelente exemplo dos vinhos brancos do Dão quando, sempre com o Encruzado por base, recorre a várias castas.
Nada tem a ver com muitos vinhos brancos apresentados como sendo do Dão e que seguem padrões de gosto que estão tão bem para o Dão como para o Alentejo ou para a região de Lisboa.

Adega Cooperativa de Mangualde -Adega de Mangualde Tinto 2013


A Adega Cooperativa de Mangualde, uma das várias adegas cooperativas que existem na região com bons vinhos, tem a vantagem de apresentar uma loja simpática onde se pode ver e provar o que têm para venda. Ia com a ideia de comprar o Foral Dom Henrique Reserva, que encontrara numa promoção de supermercado, mas foi-me proposto o Adega de Mangualde e aberta uma garrafa para prova.
A loja tem uma sala adequada para o efeito e não tem medo de que haja pessoas que só lá vão para beber à borla. Ficámos sozinhos com a garrafa, provámos e comprámos.
Este tinto, das castas Touriga Nacional, Tinta Roriz e Jaen, está bom e cheio de força e é uma óptima compra. Com ele veio também o "Encruzadito", um licoroso branco feito de Encruzado que é um óptimo vinho de aperitivo. (Também há um licoroso tinto, o "Tôriguito".)

Quinta da Fata - Tinto Clássico 2012 e Tinto Reserva 2011



A Quinta da Fata, em Vilar Seco, nos arredores de Nelas, é para mim um ponto de paragem obrigatório. Não apenas pelo vinho mas pelas boas recordações que mantenho do local e pela simpatia dos seus anfitriões (Eurico do Amaral, Maria Cremilde e Rita).
Depois de ter começado a funcionar como alojamento de turismo real, passou também a produzir vinho, recuperando uma tradição familiar que foi marcante em Nelas.
Já com treze anos de produção vinícola, não guardo uma única má memória dos seus vinhos tintos (com monovarietais Touriga Nacional que são esplêndidos) e brancos (só Encruzado, cada vez melhor), que têm contado com o apoio do CEV e a sabedoria de um enólogo experiente, António Narciso, e a eles me tenho aqui referido.
Nesta altura, bebem-se, e com proveito, o Tinto Reserva 2011 e o Tinto Clássico 2012.
O primeiro (Touriga Nacional e Tinta Roriz) é um vinho nobre e elegante e o segundo (Touriga Nacional, Tinta Roriz e Alfrocheiro) é um vinho mais pujante, cheio de força e com uma vivacidade muito própria. Tendo estágio em barricas durante um ano, depois da estabilização em lagares de granito, não revelam o sabor mais redondo da madeira. É um equilíbrio diferente que lhes dá um estatuto também diferente, nesta panóplia de tintos merecedores de todo o respeito.

"22.11.63" servido às postas


"22.11.63", a mini-série baseada no romance homónimo de Stephen King (que tem por tema uma incursão no passado para salvar o presidente americano John F. Kennedy), tem oito (8) episódios.
A sua transmissão em Portugal pelo canal Fox transformou-a, no entanto, numa mini-série com nove (9) episódios.
Não se percebe se é deliberado, se é incúria ou se é obra do acaso porque o modo desordenado como os episódios foram sendo transmitidos (dois por noite... ou 1,75 por noite?!), com interrupções aleatórias para publicidade, por vezes sem genéricos e sem se perceber onde terminava um e começava outro, permite tudo.  



sábado, 7 de maio de 2016

Desonestidade e preconceito

É de supor que no Ministério da Educação se conheça a rede escolar. Que se saiba quanto custa cada aluno no ensino privado e no ensino público por regiões. E que haja um retrato rigoroso, naturalmente referido ao ano lectivo anterior, sobre as escolas e turmas que funcionam em cada região e em cada concelho.
Devia ser esta a base (custos e benefícios) para uma decisão racional e inteligente no momento presente sobre a situação  relativa aos "contratos de associação": onde é que eles são ainda e serão necessários e onde é que já não são.
O que este governo fez (onde um czar sindical usa uma espécie de ministro da Educação na lapela, por conveniência de serviço) foi um acto de desonestidade política e por dois únicos motivos: atacar, em geral, o ensino privado por preconceito ideológico e para conseguir contratar mais professores para o ensino público, professores esses cuja contratação nunca poderá ser considerada por um governo que queira ser rigoroso na gestão das contas públicas mas que convém aos cofres sindicais.
O czar sindical, o novo Cardia em versão "alienígena" e o actual governo agiram com desonestidade e com preconceito.
Como a questão da "escola pública" está ausente desta polémica, não se aconselha às almas inteligentes mas ingénuas que acreditem neles, para não fazerem figuras tristes. 


Um ministro fica sempre bem na lapela, tipo broche de senhora

quinta-feira, 5 de maio de 2016

As codornizes do PSD caldense

"Que atenção dá a Câmara das Caldas às freguesias fora da cidade?", perguntou o "Jornal das Caldas" aos representantes partidários que vão ao seu programa "Pontos de Vista" (notícia aqui).
A pergunta foi, e é, correcta, acertada e oportuna. As freguesias rurais são, neste concelho possivelmente como em todos, as mais desfavorecidas de todas as freguesias. No caso de Caldas da Rainha, a estúpida agregação de freguesias transferiu algumas para a capital do concelho e é visível o desprezo que a "nomenklatura" partidária vota a tudo aquilo que fica fora da cidade e, no tempo quente, longe do eixo-Caldas da Rainha (cidade)/Foz do Arelho.
Nas suas respostas ao "Jornal das Caldas" os representantes do PS, do CDS, do MVC, do PCP e do BE (que não existe na Assembleia Municipal) lá se desenvincilharam mas o que ficou foi uma colecção de generalidades, simpáticas mas pouco esforçadas, confirmando o desinteresse que a matéria lhes merece.
O PSD, no entanto, é que se encheu de brios e quis fazer figura de conhecedor da realidade concelhia e foi, literalmente, às codornizes.
Em vez de dar como exemplo do "apoio" camarário às freguesias do interior a reparação de estradas, a ajuda aos idosos isolados ou a substituição das condutas de abastecimento de água, o grande exemplo que deu foi ... o "festival da codorniz" numa das freguesias! Estaria com fomeca o digno representante da "nova dinâmica"?!


A "nova dinâmica" em versão codorniz

quarta-feira, 4 de maio de 2016


Com o meu voto não conta!


"Jornal das Caldas", 4.05.16

O palavrão favorito dos regedores autárquicos que obram

"Requalificar" deve ser uma das palavras mais queridas da língua de pau dos micro, pequenos e médios regedores que enxameiam as câmaras municipais e as juntas de freguesia. Um pouco à semelhança de certos ministros em pastas sazonais, querem sempre (des)fazer qualquer coisa para deixar marca, num espécie de versão política da mijadela canina.
"Requalificar" é o novo palavrão da moda. Na sua origem, "requalificar" significa "qualificar" novamente, e "qualificar" (vamos ao acessível Priberam) é:

1. Dar uma qualificação a.
2. Indicar a que qualidade ou classe pertence alguém ou alguma coisa.
3. Apreciar; avaliar; classificar; enobrecer; ilustrar.

Mas para os regedores municipais (e contaminando já a imprensa), "requalificar" é fazer obras. É esventrar ruas, destruir o que os outros tinham construído, impor perspectivas urbanas muito pessoais, agradar (agora é moda) a quem não precisa de se deslocar em carro próprio, tentar erguer uma porcaria qualquer de aparência diferente e sempre, também, com o olho posto nas eleições. E sempre a salvo de sofrer com o caos porque o seu veículo é da câmara e quem guia é o motorista.
Parece haver uma regra que dita que o presidente da câmara que mais estragos faz na sua cidade é o candidato teoricamente mais bem colocado para vencer as próximas eleições.
Mas tudo seria mais fácil se, em vez do palavrão "requalificar", os regedores autárquicos usassem o substantivo "obras" e o verbo "obrar" para as lindas coisas que fazem. Talvez os eleitores percebessem melhor.


Cais do Sodré (Lisboa), © "Observador"